Coqueiro lutador: A chegada de Assuério Silva à Chute Boxe

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Verão de 1999, praia do Futuro, Fortaleza. O Sol começava a se pôr, enquanto um grupo de trabalhadores terminava a montagem do ringue, colocando uma moto Honda 125cc numa passarela e posicionando centenas de cadeiras na areia. Foi quando o promotor do 2º Desafio Bad Boy de Vale-Tudo, Evilázio Feitosa, me chamou para conversar com um certo ar de preocupação: “Alonso, tenho uma má notícia para te dar, meu velho. Te trouxe aqui para cobrir um torneio de oito lutadores, mas infelizmente, a 3 horas do evento começar, só temos três lutadores”.

Diante da situação absolutamente desesperadora do promotor, só consegui formular duas perguntas: “E o que você vai falar para o público que daqui a pouco começa a chegar? E à Bad Boy, que patrocinou o evento? ”.

Foi quando ele respondeu com a maior tranquilidade do mundo: “Mas o torneio vai ocorrer, só que com quatro lutadores”.

Diante de toda aquela certeza, emendei a fatídica pergunta: “Mas como você vai arrumar um quarto lutador tão em cima da hora? ”. Naquele momento, vinha passando um rapaz com um carrinho de mão cheio de cocos. Feitosa não pensou duas vezes: “Ô, nego do couro duro, você quer ganhar aquela moto que está ali em cima?”. De pronto o “coqueiro” respondeu cheio de atitude: “Quantos eu tenho que quebrar para ganhar ela? ”.

Quando Evilázio levantou dois dedos de sua mão direita, Edson Tigre (1,84m/118kg) aceitou na hora, sem saber que acabara de salvar o evento e não ganharia 1 real por isso.  E pior que o Coqueiro não decepcionou, mesmo sendo totalmente leigo, usou sua vantagem de peso para dar trabalho a Luís Alberto, o “Leão da Paraíba” (1,80m/93kg). O faixa-roxa precisou de quase 10 minutos para finalizar o novato. “Eita nego do couro duro, quase quebrei minha mão de tanto dar nele. Isso treinado vai ser ruim de aturar”, reconheceu Luís, que saiu da luta esgotado e acabou sendo presa fácil na final para Assuério Silva (1,85m/101kg), que havia nocauteado rápido em sua primeira luta o representante da Luta-Livre Leopoldo Serão (1,82m/83kg). 

Na grande final  “Demônio Nordestino” só precisou de 6 minutos para obrigar o paraibano a desistir, após aplicar um knock down, definindo a luta com chutes e socos e faturando a moto. O curioso desta história é que, depois de descobrir sua vocação para a luta, Edson Tigre abandonou o carrinho de cocos e passou a ser um dos pesos pesados mais requisitados do circuito nordestino de Vale-Tudo.

RUPTURA DE JANGULAR

Campeão do torneio, após vencer duas lutas numa noite e ganhar como prêmio uma moto 125 cc, Assuério Silva, cheio de contas para pagar e sem querer vender a moto, decidiu chorar um acréscimo na bolsa para o promotor. “Poxa, Evilázio, salvei seu evento… Imagina o  mico que não seria, depois de toda publicidade que você fez na região, se não tivesse torneio”, argumentou o campeão.

Mas Evilázio era duro na queda. “Está complicado, campeão. Essa moto foi bem cara. Pensa bem, qual evento aqui do Nordeste dá uma moto zerinho como esta?”. Quando percebeu que não arrancaria nada do promotor, Assuério resolveu apelar, e mostrando seu dente canino, que perfurara o lábio inferior como um piercing, tentou a última cartada. “Dá uma força aí. Ainda vou ter despesas com hospital. Olha aqui, o dente perfurou minha ‘jangular’”, disse o campeão, sem imaginar que a veia jugular estava localizada alguns bons centímetros abaixo do lábio, mais especificamente em seu pescoço.

Sem querer, eu acabaria dando aquele empurrão de que o Assuério precisava. No final de semana seguinte, fui a Curitiba e comentei com Rudimar Fedrigo, líder da Chute Boxe, sobre o talentoso “Demônio Nordestino”. Carente de um peso-pesado em sua equipe, Rudimar o convidou para lutar no Meca 2. A atuação de Assuério, finalizando rapidamente Rodrigo da Silva, lhe valeu um convite para treinar na maior equipe de MMA da época. 

Como principal peso-pesado da equipe curitibana Chute Boxe, Assuério não tardou a chegar no maior evento do mundo, o Pride, Onde, não só passou a representar a maior potência do Vale-Tudo na época, junto com Wanderlei, Pelé, Ninja e Anderson, como acabou sendo pivô da briga que iniciou a rivalidade com a equipe arquirrival carioca, a Brazilian Top Team, naquele famoso episódio da discussão entre Arona e Wanderlei no café da manhã do Tokyo Hilton. Mas esta a gente relembra num outro dia.